segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

A morte do rio

"Querem trazer o rio São Francisco para o Ceará,
mas não salvam o riacho Pajeú, berço de Fortaleza". Christiano Câmara

Quando um rio chora,
Chora de verdade,
Bem poucos conseguem ver.
Em seu silêncio de morte,
Pela perda cristalina,
Chora lágrimas tão espessas
Que ora parecem suas águas
Ter seu fluxo estancado.
Na riqueza de sons em que existia,
Mata e água eram música,
Mas desabitado de cardumes,
Sua água sem troca
Sem a vida que guardava,
Encolheu-se em soluço
Pardacento e opaco
Nas breves borbulhas de suas grotas.
Então o rio segue só
Inerte em sono que já não desperta
Suas cascatas sem canto.
Sem sonhos, sem ímpeto,
Sem marolas no barranco.
Aí chora lágrimas tão sentidas
Como desconsolo de dar dó.

O rio fica mudo.

Como quem só respira pela boca
Segue em passo trôpego.
Já quase não flui
Pelo lixo maldito que o sufoca.
Se pouco pode correr,
Assim todo dia morre um pouco,
Já quase não agita os braços,
O rio náufrago perdendo fôlego.

E a cada vez que vem a chuva,
Desprotegido das copas,
Impiedosa lhe desbarranca,
Deixando o leito sempre mais raso
Em choro baixo de lamúria.
É caça se entregando à morte.
Em últimos estertores esperneia
Com a terra já pelo pescoço
Garganta em sangue é presa segura.

O rio enfim agoniza.

Incrédulo quem só agora o vê,
O rio réptil gravemente ferido
Pela areia seca que quase lhe suga,
Mal se esgueira ao próximo poço
Por triste filete que ainda lhe corre.

Quem o viu caudaloso
Tardio lhe causa espanto,
Pois só agora toma consciência
Que é assim que o rio morre.

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